A Isonomia de Vencimentos na Constituição Brasileira
A Isonomia de Vencimentos na Constituição Brasileira Wage Isonomy in the Brazilian Constitution Autor: Vladmir Oliveira da Silveira vladmir@aus.com.br Revista Acadêmica APG Edição Especial Ano XVII – Numero 3 – 2004 RESUMO Após a promulgação da Emenda Constitucional n.19/l99B, dentre inúmeras questões jurídicas que têm despertado a atenção dos estudiosos, uma das mais polêmicas, sem dúvida, é a atinente à exclusão da menção expressa da isonomia do artigo 39, parógrafo 1° da Constituição Federal. Nesse sentido, o objetivo deste ensaio será analisar o referido princípio da isonomia e o seu alcance em relação aos servidores públicos, principalmente no que tange à isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhados. Palavras-chave: Isonomia, Vencimentos, Servidores Públicos. ABSTRACT After the promulgation of the Constitutional Amendment n.19/1998, among countless juridical subjects that have focused the specialists’ attention, one of the more controversial, with no doubt, is that related to the exclusion of the expressed mention of isonomy from the first paragraph of the article 39 of the Federal Constitution. ln that way, the objective of this paper is to analyze the referred principie of isonomy and its reach for the officials, mainly in what related to the isonomy of wage for positions with the some or similar attributions. Key words: lsonomy, Wage, Official. A isonomia Antes de qualquer análise mais profunda, convém frisar que o princípio da isonomia decorre imediatamente do princípio republicano (estruturante), sendo, consequentemente, um princípio constitucional geral (Canotilho, 2001) do ordenamento brasileiro. Desse modo, deve ser analisado e aplicado no contexto do sistema constitucional. A isonomia pode ser traduzida como a igualdade diante da lei, diante dos atos infralegais, ou seja, diante de todos os manifestações do poder, sejam materializadas em fatos concretos, quer sejam expressas em normas. Em outras palavras, pode-se dizer que nenhuma lei poderá ser editada em desconformidade com a isonomia existente entre os cidadãos. Atualmente, esse princípio está presente na grande maioria das Constituições em vigor no mundo e, na Constituição Brasileira de 1988, abre o Capítulo I (Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos), do Título 11 (Dos Direitos e Garantias Fundamentais), estabelecendo que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes” Nesse sentido, o princípio da isonomia exprime a igualdade legal para todos, à medida que institui a igualdade formal, qual seja, que todos são iguais perante a lei. Porém, esse preceito magno não é só voltado para o aplicador da lei, mas também paro o próprio legislador. E, justamente, por isso o antigo artigo 39, parágrafo lº, da Constituição Federal afirmava que” a Lei assegurará, aos servidores da administração direta, isonomia de vencimentos paro cargos de atribuições iguais ou assemelhados do mesmo Poder ou entre servidores dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, ressalvados as vantagens de caráter individual e as relativas à natureza ou ao local de trabalho”. Ocorre que a Emenda Constitucional n. 19/1998, que modificou esse dispositivo constitucional estabelecendo critérios mais específicos acerca da fixação do vencimento e remunerações relacionados aos servidores públicos, retirou a menção expressa à garantia. Ou seja, o Poder Reformador, pretendendo ajustar os critérios para o recebimento dos vencimentos por parte dos servidores públicos, deixou de mencionar a expressão “isonomia de vencimentos” no novo texto da Carta Magna. Note-se, todavia, que a nova redação não proibiu, nem restringiu, apenas deixou de mencionar um princípio que continua expresso e vigorando em nossa Constituição. Entretanto, a simples alteração desse dispositivo constitucional bastou para alguns operadores do direito, e até doutrinadores, passassem a sustentar a suposta inaplicabilidade do princípio da isonomia de vencimentos entre os servidores públicos. Portanto, 0 objetivo deste ensaio será analisar o referido princípio da isonomia e o seu alcance em relação aos servidores públicos, principalmente no que tange à isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhadas. Princípio e regra no direito constitucional Primeiramente, convém analisar o sistema constitucional, em que a isonomia está inserida, para, num segundo momento, identificar a sua aplicabilidade no caso concreta. Cumpre esclarecer que se adotam, na íntegra, os ensinamentos e a doutrina de José Joaquim Gomes Canotilho (2001), que encara as regras e os princípios como sendo duas espécies de normas, havendo, portanto, entre elas, somente uma distinção entre espécies de um mesmo gênero. De acordo com o jurista português, a distinção entre norma e princípio é uma tarefa complexa, pois compreende a reflexão sobre pelo menos cinco critérios, a saber: 1) grau de abstração – enquanto os princípio possuem um elevado grau de abstraçõo, as regras têm uma abstração relativamente reduzida; 2) grau de determinabilldade – no caso concreto, se os regras são passíveis de aplicação direta, os principias, por serem de sua natureza a indeterminação e abstração, demandam mediações concretizadoras; 3) caráter de fundamentalidade – diferentemente das regras, os princípios são normas de natureza ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico, devido à sua posição hierárquico no sistema de fontes, ou sua relevância basilar dentro do sistema jurídico; 4) proximidade da idéia de direito – os princípios se constituem verdadeiros standards, juridicamente vinculantes e inseridos nas exigências de justiça, conforme o teoria de Dworkin (1977), ou na idéia de direito, de acordo com Larenz ( 1997). Por sua vez, as regras nem sempre refletem esses conceitos, tendo, na maioria dos vezes, conteúdo sistemático (adjetivo); e, 5) natureza normagenética – os princípios constituem a ratio das regras, isto é, são normas que estão na origem das regras jurídicas, exercendo assim uma função normagenética de fundamentação. Disso tudo, pode-se concluir que os princípios são normas multifuncionais pois, além de desempenharem um papel argumentativo dentro do ordenamento, também prescrevem normas de condutas, no que pese 0 elevado grau relativo de abstração. Nesse sentido, do mesmo modo que atuam como cânones de interpretação, possibilitando a identificação da ratio legis de uma prescrição legal, em outras ocasiões desempenham função integrativa e complementar do direito, revelando regras que não estão expressas em nenhuma disposição legal. Neste estudo, os princípios serão analisados, sobretudo, na sua qualidade de normas genuínas, qualitativamente distintas dos regras, conforme já explicitado. Nesse sentido, deve-se frisar que, diferentemente das regras, dentro do sistema jurídico, os princípios irão também aferir problemas de peso, e não somente de validade. Em outras palavras, pode-se dizer que enquanto as regras suscitam apenas relações de validade, os princípios ponderam valores com objetivos