Os contratos na perspectiva humanista do Direito: o nascimento de uma nova teoria geral dos contratos
Os contratos na perspectiva humanista do Direito: o nascimento de uma nova teoria geral dos contratos Clique aqui para acessar Centro Universitário de Maringá Programa de Pós Graduação em Direito. Revista Jurídica Cesumar – Mestrado Autor: Vladmir Silveira Introdução O presente trabalho procura trazer um estudo, assim como propor uma reflexão, acerca da influência dos direitos humanos nas relações contratuais, partindo da perspectiva clássica da força obrigatória dos contratos, designadamente pelo princípio do pacta sunt servanda, evoluindo para o reconhecimento da necessidade da presença da boa-fé na exteriorização da vontade que motiva a relação contratual, passando pela Revolução Industrial e conseqüente fortalecimento o capitalismo liberal e do individualismo, até se alcançar a perspectiva social e solidária dos contratos e o reconhecimento de novo modelo de contrato, firmado principalmente pela necessidade humana de consumo, o que levou à massificação das relações contratuais, assim como ao dirigismo Estatal para tutela dos interesses da parte mais fraca da relação. Nessa perspectiva procuramos desenvolver tanto o conceito de contrato tradicional e suas conseqüências jurídicas, especialmente no que tange aos vícios da vontade; assim como buscamos apresentar a idéia de contrato contemporâneo e o novo conceito de contrato pela ótica do solidarismo Constitucional. Pretendemos levantar o debate de temas atuais relacionados aos contratos, mas sem a pretensão de esgotá-los, como a crise dos contratos; o princípio da autonomia da vontade e seu confronto com o princípio da autonomia privada; e o diálogo das fontes. Por fim, será abordada a chamada nova teoria geral dos contratos no que tange à releitura do princípio da boa-fé, hoje definido como boa-fé objetiva; assim como o princípio da função social e solidária dos contratos como limite da liberdade contratual. 2. Formação histórica e pressupostos ideológicos dos contratos A reconhecida interdisciplinaridade dos estudos jurídicos com outras ciências humanas, especialmente a Social, a Política e a Economia, assim como a evolução histórica dos direitos humanos, a partir do que se concebeu uma nova perspectiva à dignidade da pessoa humana pelo processo da dinamogenesis[1][2], conferiu ao contrato uma nova roupagem, pela superação da idéia de que a igualdade formal dos indivíduos asseguraria o equilíbrio entre os contratantes, fosse qual fosse sua condição social. Nessa perspectiva, destacamos primeiramente o conceito de contrato conforme ensinamento da Escola de Pandectas, que adota o modelo codificado, pela qual contrato é uma categoria geral e abstrata que, segundo as regras da lógicaformal, pode ser reduzido à unidade no sistema conceitual. Tal sistema assemelha-se a uma pirâmide, que no topo contém um conceito geral ao qual se reduzem os demais conceitos abaixo subseqüentes, como subtipos daquele conceito generalístico.[3] Segundo Puchta[4], é tarefa do jurista a conexão lógica dos conceitos, que formará a consciência sistemática pela percepção do sentido ascendente dos conceitos identificados por intermédio dos termos médios que integram sua formação. Na escala da genealogia dos conceitos, o conceito de contrato sobe ao negócio jurídico, e daí para o fato jurídico, formando uma pirâmide. Nessa perspectiva, contrato seria negócio jurídico bilateral ou plurilateral[5] que por conter todas as características do negócio jurídico formaria um conceito derivado, possuindo todas as características gerais do negócio jurídico e outros elementos especializantes. Em que pese a contribuição da concepção de contrato acima exposta, outras correntes de pensamento também influenciaram na criação de seu conceito atual, dentre as quais se destacam: (i) a corrente de pensamento dos canonistas e (ii) a Escola do Direito Natural. A corrente de pensamento canonista ficou marcada pela substancial relevância atribuída ao consenso e à fé jurada na formação do contrato e obrigações dele decorrentes. Importa destacar que a corrente canonista significou um marco, pois foi a partir daí que se abriu caminho para os princípios da autonomia da vontade e do consensualismo[6]. Sob tal ótica, para a criação da obrigação, necessária e suficiente seria a declaração da vontade, desde que aliada ao dever de veracidade, valorizando-se com isso a palavra dada e reconhecendo-se sua respectiva aptidão para criar o vínculo obrigacional, assim como a necessidade de seu cumprimento. Nesse contexto, independente da forma do pacto, caberia ao direito assegurar a força obrigatória dos contratos como mecanismo jurídico de tutela dos valores envolvidos na relação contratual sempre que verificada a vontade livre e a fé jurada. Por outro lado, para a Escola do Direito Natural – racionalista e individualista –, o fundamento do nascimento das obrigações se encontra na vontade livre dos contratantes. Portanto, da mesma forma que a corrente de pensamento dos canonistas, a Escola do Direito Natural valorizava o consenso e o dever de veracidade, que é de direito natural. O diferencial está na forte carga individualista desta linha de pensamento, fruto da ideologia dominante na época de sua cristalização, revelada pela influência do regime capitalista de produção nos planos econômico, político e social, marcando o jusnaturalismo pelo individualismo, ou seja, pela superestimação do papel do indivíduo. Nesse sentido, com a acentuação do capitalismo, que tem sua base filosófica em Locke, maior importância se deu ao individualismo como reflexo da Revolução Industrial, acarretando a concentração de riquezas nas mãos do poder econômico privado, sendo, a partir daí, o direito de propriedade considerado um direito natural, protegido contra as forças do Estado como forma de garantir o abuso do poder político. De fato, o capitalismo funda-se nas liberdades individuais – liberdades negativas de primeira dimensão – em especial a propriedade privada. Por outro lado, reconhecendo-se no capitalismo um direito humano, qual seja o direito de propriedade, abre-se margem à interpretação do capitalismo na perspectiva humanista dos direitos, em todas as suas dimensões. É nesse sentido que se fala atualmente em capitalismo humanista, conforme defende o Professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Ricardo Hasson Sayeg, afirmando que “o espírito capitalista e o espírito de fraternidade são convergentes na medida em que não existe capitalismo sem que se reconheçam os direitos humanos. E conclui dizendo que “o que é certo é que os direitos humanos com todas as suas dimensões configuram um feixe indissociável, não cabendo se reconhecer uns e excluir outros.[7] Dentro desta perspectiva, ensina Willis Santiago Guerra Filho: […] Mais importante, é que os direitos gestados em uma geração,